A Cruz da Muribeca (Rio Itabapoana - 1759)

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A Cruz da Muribeca (Rio Itabapoana - 1759)

Já que estamos numa noite de recordações, vou lhes contar a história da «Cruz de Muribéca»;
Nos tempos coloniais em que Muribéca era uma grande fazenda de Jesuítas, deu-se lá um facto que, pelo seu aspecto phantastico, passou à posteridade como uma simples lenda.
Dizem por aí, que os povos que não têm história são felizes, mas o que affirmo, é que as raças sonhadoras são as que possuem lendas...

Lenda ou História, verdade ou mentira, a tradição que existe em torno da mysteriosa cruz tem um sublime encantamento...
Em uma manhã de Outubro de 1759, um mez depois que D. José I, pelas constantes insinuações do marquez de Pombal, assignara a lei que expulsava dos domínios portuguezes os regulares da companhia-chamada-de Jesus, ancorou, nas proximidades da praia de Muribéca, um veleiro portuguez, portador de varias noticias e conselhos secretos entre os quaes o communicado da expulsão immediata dos Jesuitas do Brasil.
Houve então, naquelle dia, um grande alvoroço na povoação.
Os padres apparentavam muita calma e indifferença, mas, quem andasse pelo interior da Casa Grande da Fazenda, havia de vel-os passearem agitados pelos corredores... E, não era para menos....

O poderoso Ministro do Reino Portuguez vingava-se da Companhia de Jesus.

Quando, pelo terremoto de Lisboa, Pombal pedira ajutorio monetario ao Superior Jesuíta, lhe fôra negado. Os irmãos da Fazenda tudo sabiam e tinham mesmo a certeza que a expulsão dos jesuitas significava confiscação de todos os bens da grande Companhia.

Era, pois, indispensavel uma medida preventiva. E para tal, sob o conselho do Reitor do Collegio de S. Thiago, de Victoria, ás horas mortas da noite, reuniram-se, na sachristia da igreja de Muribéca, todos os jesuitas da Fazenda, e idealizaram um plano de defesa.

Ficou então resolvido que se enterrariam todas as riquezas.
Guardaram numa urna todo o ouro existente, e com os castiçaes, alfaias da igreja, prataria de casa, papeis da Fazenda, metteram num sino de bronze e o collocaram num carro de bois.
Quando anoiteceu, sob a treva, ao piscar nervoso da luz pallida das estrellas e da lanterna hysterica dos pyrilampos, um pequeno acompanhamento sob a cadencia molle, marcada pelo ranger do madeiro do carro, tomou rumo ao mar.
Duas leguas distantes da praia, entre uma vegetação rasteira, num logar plano e meio arenoso, cavaram um grande buraco e ahi enterraram todas as riquezas da grande Fazenda de Muribéca.
Reza a lenda que, logo depois de aterrado o sólo, subitamente o ceu tornou-se tenebroso...
O vento começou a soprar mais forte cantando na matta, pelo zig-zag dos arvoredos, uma canção irritante e sinistra.

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